À procura da
Palavra
P. Vitor
Gonçalves
DOMINGO XIII
COMUM Ano B
"Quem tocou
nas minhas vestes?"
Mc 5, 30
Toques de vida
Quem poderá dizer se foi por termos sido
modelados pelas mãos de Deus que sentimos a importância de tocar e de sermos
tocados? Nascemos necessitados que nos toquem com carinho e cuidado, e
descobrimos com o tempo o toque da amizade e do amor. Até aprendemos a dizer
que há coisas, experiências e pessoas que "nos tocam". No fundo,
podíamos contar a nossa vida a partir daquilo que verdadeiramente "nos
toca" e que, penetrando no íntimo do ser e do pensar, estrutura a pessoa
única e bela que é cada um de nós. Para não falar de todos aqueles que tocamos,
algumas vezes sem o cuidado devido, para quem somos mais importantes do que
julgamos.
Viajar, descobrir outras paisagens,
conhecer novas pessoas é romper as fronteiras do quotidiano e experimentar a
riqueza de tocar e ser tocado. A beleza das terras da Nova Inglaterra e o
acolhimento dos açorianos de Fall River encheram estes dias de descoberta do
Novo Mundo, de imensas experiências. A fé vivida e testemunhada em experiência
de comunidade, estruturada numa admirável partilha de responsabilidades, em que
muitos se empenham para realizar uma festa extraordinária, foi algo que me
tocou profundamente. E o trabalho dedicado daquele que é o seu pastor,
incansável e inconformado no dinamismo que o evangelho reclama, na atenção aos
sinais dos tempos (o "toque" do Vaticano II) foi o que mais me tocou.
Os evangelhos estão repletos de narrações
em que Jesus rompe as inúmeras barreiras religiosas que separavam as pessoas em
puras e impuras, que proibiam e desaconselhavam o toque físico. Ele não se
cansa de "tocar" com as mãos e com as palavras que saram feridas e
até ressuscitam mortos. Com uma onda de ternura e bondade relembra que não
somos espíritos descarnados, mortos-vivos ambulantes, e precisamos destes
incontáveis "toques" que transmitem vida. O cristianismo vive e
celebra-se em experiências sensoriais, eleva o corpo humano a lugar da manifestação
do amor de Deus, e definha quando deixamos de "tocar" a vida e de
levar a todos a maravilha de Deus nos "tocar". Ah, esterilidade de
ideias e até de conceitos teológicos que não assumem a encarnação de Jesus em
todas as consequências! Jesus toca porque se aproxima, sem defesas nem
guarda-costas, toca porque ama, e toca para que o amor salve. Comunga a nossa
existência e partilha connosco a sua essência. Dá a vida nova, pega-nos pela
mão e levanta-nos. Não gasta tempo em discursos vazios ou condenações, em piedosas
intenções ou a dizer mal da morte. Confirma a fé de quem lhe tocou nas vestes,
e ressuscita a filha querida de Jairo.
Queremos tocar Jesus assim? Deixamos que
Ele nos toque para nos ressuscitar destas mortes que atrofiam e matam
devagarinho? Somos presença de Jesus a tocar o mundo? Neste domingo, nas
ordenações de padres e diáconos em Lisboa, as mãos de bispos e padres vão tocar
suavemente as cabeças dos que são ordenados. Pedindo que o Espírito Santo desça
sobre eles. Que as suas mãos e as suas vidas saibam tocar como Jesus!
in Voz da Verdade 01.07.2012