quarta-feira, 28 de outubro de 2009

A BOLINHA CASTANHA



Saí de casa, era uma manhã fria, sem Sol, em que as árvores pareciam mãos enormes buscando a Primavera no céu sem cor…e a chuva caía…caía…

Comecei a andar, abri o guarda-chuva, a rua parecia-me imensa, toda branca, beijada pela chuva. Os pardais voavam nas árvores talvez lobrigando nelas flores, Sol. Senti que era Inverno.

Virei a esquina e ali no chão estava uma bolinha castanha que já não chamaria mais a Primavera… Fiquei parada, contemplando o passarito, como se ele fosse um sinal vermelho que me impedisse de avançar.

Olhei, olhei mais, vi uns olhos abertos, uns olhos sem vida e aquelas penas castanhas…não mais enfrentariam o vento…

Não podia fazer nada. Andei. No ar voavam mais pardais e aquele ali, jamais voaria. Andei. Ouvi a mulher das flores a apregoar e a carroça das hortaliças que chiava longínqua.

Na calçada soaram enfim os meus passos, caminhando sozinhos com a chuva…


Olhei para o céu, brilhava nele o Sol, a chuva tinha parado e o arco-íris era uma cavalgada imensa para o infinito…

Pardal… nascia a manhã dos pregões, das conversas, nasciam nos ninhos mais pardais e aquele sozinho, perdido na multidão das pedras brancas, jamais esperaria o Sol, as flores, o arco-íris, estava morto, enfim.

Adília Lopes, 1971

1 comentário:

Baleia disse...

Olá Superiora!!
estava a ler este texto convencidissima q tinha sido escrito por ti.
Mas a parte "Ouvi a mulher das flores a apregoar e a carroça das hortaliças que chiava longínqua" deixou-me a pensar... Mas em que zona de Lisboa é q ela tem andado q ainda há mulheres a apregoar e... carroças??!!

OK! quando cheguei ao fim, percebi!

Está lindo!

bjnhs, bjnhs!!